Conversador – Uma breve história

Encontrei esta história no blog SHTF Fiction e decidi traduzi-la para vocês se entreterem um pouco, espero que gostem. O texto é longo mas a história dá muito material para reflexão.

Brandon cuidadosamente passou pelas frequências de rádio procurando por aquele sinal mais forte que havia pego algumas semanas passadas. Passando pelas bandas marítimas ele localizou uma voz, que apesar falar em espanhol, deu a ele um estranho conforto. No final das contas, significava que alguém estava vivo. Quer dizer, alguém além de Brandon e seu cachorro, Cooter.
Brandon correu para sua cabine no meio de Abril quando a praga começou a mostrar-se feia no leste. Ele parou tempo o suficiente para pegar suprimentos de última hora antes de dirigir quatro horas até as montanhas de St. Francois Sauk onde seu esconderijo era localizado. Desde então, ele se “enterrou” e esperou a bagunça toda passar.
Ele tinha um sistema de captação solar de médio porte que fazia sua água continuar sendo bombeada para a cabine, carregava algumas lâmpadas LED e o rádio de ondas curtas. No começo, ele limitou suas comunicações para uma hora por dia. Durante o resto do dia ele trabalhava em seu jardim, construía sua colheita e ia preparando o local para a duração de sua estadia. Mas, depois de um tempo, ele se encontrou fuçando nas frequências diferentes cada vez mais.
Brandon tinha poucos amigos, nenhum que ele conseguisse pensar pelo nome, apenas sendo conhecidos do trabalho ou semelhantes. Casou-se uma vez e durou pouco. Seu distanciamento e falta de paciência com as “conversinhas do dia” acabou afastando sua esposa, eventualmente. Ele não havia falado com ela em mais de uma década e podia tristemente assumir que ela foi levada junto com todos os outros.
Por enquanto, Brandon procurava qualquer pedaço de informação do mundo lá fora, mais importante que isso, pelo som de outro humano. Cooter estava deitado em seus pés, descansando sua cabeça nas patas cruzadas, como esteve durante as últimas horas.
Foi então que o alto falante de seis polegadas emitiu uma voz masculina:
“Esta é a estação WGY906 no ar. Alguém me ouve?” Disse a voz.
“Este não é o protocolo correto”, pensou Brandon. “Claramente algum amador operando o aparelho”.
Ele então pegou seu catálogo e procurou pela identificação WGY906. Ele quase caiu da cadeira quando leu que era a identificação de uma unidade da FEMA no norte do Texas.
“Esta é a estação WGY906 no ar. Vamos lá pessoal, tem de haver alguém acordado nesta noite!” Disse a voz que Brandon percebeu ter um sotaque caipira.
Brandon decidiu manter suas cartas na manga e ir com calma, considerando que era a FEMA.
“Aqui é K… KGX713, câmbio. Repito KGX713, câmbio. Eu posso ouvi-lo muito bem, câmbio”. Brandon emitiu.
“Mas que maravilha, nós temos um rapazes!” disse a voz do homem mais afastado do microfone como se tivesse virado de costas por um momento. Brandon achou que podia ouvir pelo menos mais uma voz no fundo, talvez duas.
“Desculpe, eu tinha de falar para o resto do time. Como você está indo aí KG.. uhhhm… KG?” Ele perguntou.
“Tudo positivo e afirmativo, câmbio. A identificação é KGX713. Diga, a quanto tempo você tem sua licença, câmbio?” Perguntou Brandon.
“Licença? Ah, para o radio. Eu temo que não tenho uma, KG. Nós acabamos de fazer o aparelho funcionar de manhã e estamos tentando espalhar a palavra. Meu nome é Ryan e eu estou em Dentom, Texas, ao norte de Dallas. É ótimo ouvir outra voz, como sempre. Onde você está?” Ryan perguntou.
Brandon ficou com medo. Denton era bem longe, mas quem saberia se eles não poderiam triangular seu sinal enquanto falava. Ele teria de falar rapidamente e descobrir como jogar de forma certa.
“Eu prefiro não dizer, câmbio. Da forma que as coisas andam durante os últimos meses, temos que ser cuidadosos, câmbio.” Brandon respondeu.
“Eu te entendo. Te digo o seguinte, eu vou falar sobre nós e você responde quando quiser, ok?” Disse Ryan.
“Afirmativo, câmbio”. Disse Brandon.
“Legal. Ok, então nós estamos onde te dissemos e você é a primeira pessoa que nós alcançamos com o rádio grande. Nós encontramos outros com portáteis, mas agora que estamos com este sistema ligado e funcionando, nós realmente podemos abrir nossas asas.”
Pela próxima meia hora, com Brandon anotando tudo com muita ansiedade, Ryan explicou como ele e um grupo saíram de Louisiana e conseguiram chegar até o centro da FEMA em que estavam no momento.
A esperança deles era que sendo uma “continuação de unidade governamental” encontrariam alguma espécie de autoridade e organização. Ao contrário, tudo que encontraram foram mortos. A eletricidade ainda estava ligada e como haviam computadores eles aprenderam a verdade sobre os efeitos da praga não somente nos EUA, como no mundo.
“Então, o governo já era e é a mesma coisa em todo lugar. A maioria das pessoas no mundo morreu, exceto por alguns perdidos como você e eu, KG.” Terminou Ryan.
 Brandon balançou em sua cadeira quando se deu conta da enormidade da situação, que seu coração já sabia ser verdade.
“Olha, se você quiser, KG, e se você tiver os meios, você pode nos visitar. Nós temos um bom grupo de pessoas, cada dia mais na verdade.” Disse Ryan.
“Quantos de vocês estão aí, câmbio?” Perguntou Brandon.
“Mais de duzentos agora. Nós temos eletricidade funcionando e estamos trabalhando na limpeza de corpos, sabe? Nós temos muito  a fazer e precisamos de todos que pudermos encontrar para deixar as coisas funcionando novamente.” Disse Ryan.
“Eu imagino, câmbio. Eu tenho algumas coisas para fazer agora, Ryan. Você estará no ar amanhã, no mesmo horário, câmbio?” Perguntou Brandon.
“Claro! Conversamos amanhã, KG. Cuide-se.” Disse Ryan e então a frequência silenciou-se.
Brandon diminuiu o volume no rádio e deitou sua cabeça nas mãos.
—–
Naquela noite Brandon teve um sono agitado em sua cama.
“E se este cara Ryan está falando a verdade? Se a praga realmente já sumiu e os sobreviventes estão reagrupando? E se houver uma chance de reconstruir a sociedade?”
Estas possibilidades estavam intrigando Brandon. Ele já havia se tornado um sobrevivencialista há muito tempo e se preparado, e os resultados foram positivos. Ele fugiu, sobreviveu e ainda tem suprimentos e conhecimento para continuar indefinidamente.
Mas Brandon nunca pensou o que poderia acontecer depois. Ele sempre assumiu que a vida diária seria perigosa, mas depois de um tempo, ele se juntaria a uma comunidade e compartilharia seu conhecimento e habilidades que obteve durante o tempo.
Brandom pulou da cama, ligou a lanterna LED, pegou um bloco de notas com uma caneta e começou a fazer uma lista de questões para perguntar à Ryan na próxima vez que se falassem.
 
—–
Pela primeira vez em meses, Brandon estava realmente excitado durante o dia e até se percebeu assobiarndo e sorrindo para Cooter. Ele deu ao cachorro vários petiscos, enquanto limpava sua pequena, alongada, mas eficiente cabine. Brandon não percebeu isso antes, mas ele havia negligenciado sua horta nas últimas semanas com as horas que passou em frente ao rádio e agora tinha muito trabalho para fazer.
Ao entardecer, as sombras pela janela junto com o pôr do sol mostravam que chegava o melhor tempo de transmitir via rádio. Brandon aqueceu seu ondas curtas, colocou um copo de chá e fez uma rápida viagem ao quintal para deixar Cooter fazer suas necessidades no pátio.
Olhando para o relógio, Brandon percebeu que Ryan estava alguns minutos atrasado para o tempo combinado.
“O jovem rapaz não conhece as boas etiquetas de rádio ou como ser pontual aos compromissos.” Ele murmurou para si mesmo.
Logo em seguida, o alto falante vibrou e a voz de Ryan apareceu, alta e limpa.
“Esta é a estação WGY906 no ar, quem está com as orelhas ligadas hoje à noite?” Sua voz era alta e empolgada.
Brandon ajustou o volume do alto falante e pegou seu microfone.
“Aqui é KGX713, câmbio.” Ele disse.
“KG! O que está acontecendo? Ei, você me ouviu perguntar quem está com as orelhas ligadas? Eu aprendi isso de um cara com quem conversei no Arizona ontem.” Disse Ryan.
“Eu ouvi. Se nós tivermos a chance de nos encontrar algum dia, ficarei feliz em lhe ensinar os jargões de rádio, câmbio.” Respondeu Brandon.
“Isso seria legal. Você deve ser um radioamadorista sério, não é?” Perguntou Ryan.
“Exato, eu tenho minha licença por muitos anos, câmbio. Alguma novidade  para me passar hoje, Ryan?” Perguntou Brandon.
“Pode apostar, KG. Depois de nos falarmos na noite passada, entramos em contato com cinco ou seis outros sobreviventes. Nós fizemos contatos com pessoas em todo lugar. Lesse, o cara de Arizona, alguém no estado de Washington, Wisconsin, uma mulher em Ohio e até um cara na Islândia.” Disse Ryan.
“Legal, Ryan. Eles estão pensando em ir para onde você está, câmbio?” Perguntou Brandon.
“Quase todos eles, até o cara na Islândia. Ele estava falando sobre conseguir um barco e tentar chegar até o Canada, então descer para nosso local. Ele está completamente sozinho e disse que prefere morrer no mar do que ficar onde está.” Disse Ryan, tristemente.
“Eu posso imaginar. Então essas pessoas com quem você está conversando, elas tem algumas habilidades que você precisa? Digo, sua comunidade tem uma lista de habilidades ou trocas que estão procurando? Talvez suprimentos, câmbio?” Perguntou Brandon.
“Até o momento a única coisa que precisamos é de pessoas vivas. É algo mais como “venha como você estiver” no momento. Sobre as habilidades, Casey, que está sentado do meu lado no rádio trabalhava numa loja de gibis antes de tudo isso. Evie era garçonete.” Disse Ryan.
“Existem mulheres aí também?” Disse Brandon sem pensar.
“Claro! Homens, mulheres, algumas crianças, alguns idosos. KG, seu demônio velho, você parece estar procurando por uma namorada.” Riu Ryan.
Brandon corou e olhou para baixo, como se alguém pudesse vê-lo.
“Não, eu só fiquei surpreso que você está dizendo abertamente que tem mulheres em sua comunidade. Digo, se houverem bandidos ou mal intencionados, câmbio?” Perguntou Brandon.
“Deixe que ouçam KG, eu não posso controlar as transmissões. E além disso, se há algum homem mau aí fora, ele terá de lidar com todos nós. Nós vamos lutar pelos nossos, sabe?” Disse Ryan.
“Isso é bom de se ouvir. Então como eu vou saber que você não vai me roubar e me matar se eu fizer uma visita?” Perguntou Brandon.
“O que nós roubaríamos?”
“Comida, por exemplo.”
“Porquê? As lojas estão cheias de comida, o suficiente para uma vida inteira. As pessoas começaram a morrer antes de saqueá-las.”
“E meu carro ou gasolina?”
“Eu tenho dezenas de carros diferentes que posso dirigir agora mesmo. E nós não conseguiríamos usar toda a gasolina nos tanques se quiséssemos”.
“Armas ou ouro?”
“Nós temos o depósito da Guarda Nacional logo abaixo na estrada com tudo que você pode imaginar. As lojas de jóias estão todas abertas, se alguém quisesse algo desses lugares, não que eles valham alguma coisa agora.”
“Como saberei que você não colocará correntes em mim e me tornará escravo?”
“Donos de escravos não dormem bem, KG.”
“E se eu quisesse sair se eu não gostasse das coisas por aí?”
“Como poderíamos te parar? E se você saísse, nós não teríamos pessoas suficientes para te procurar.”
Brandon parou e não disse nada por alguns momentos.
“KG, está aí ainda? Perdemos você?” Perguntou Ryan.
“Não, não perdeu Ryan. Na verdade, estou feliz que você me achou. E por favor, me chame de Brandon. Brandon Mitchell é o meu nome.”
——-
Ryan cortou a conversação depois de 15 minutos dizendo que ele tinha outros para checar, incluindo um grupo que ele conseguiu contato em Nebraska. Disse que eles estavam indo à caminho de Ryan nos próximos dois dias e queriam checar as condições da estrada. Brandon ficou com inveja.
De pé e esticando suas costas, Brandon olhou ao redor de sua cabine e percebeu o quão pequena e escura ela era. Cooter, seu cão, levantou a cabeça e olhou para seu dono sentindo que algo estava errado.
“Cooter, você gostaria de fazer uma viagem?”
 
——-
Na manhã seguinte Brandon havia preparado o local para partir. Ele decidiu que sairia em dois ou três dias depois de calcular uma rota, paradas para combustível e tomando tempo para desvios devido às condições da estrada. No mesmo tempo da noite passada, ele falou com Ryan no radio.
“Ryan, aqui é Brandon Mitchell, você sabe, KG. Está aí. câmbio?”
“KG, tudo bem por aqui amigo. Estava esperando você ligar. Então, o que decidiu fazer?” Ryan perguntou.
“Bom, depois de pensar muito, vou arriscar.” Disse Brandon.
“Ótimo, nós ficaremos felizes em ter você! Nós estivemos no rádio o dia inteiro com pessoas e grupos de todos lugares, existem muitos vivos. Então, quando planeja vir?” Perguntou Ryan.
“Acho que em um dia ou dois. Tenho que deixar o local bem fechado, colocar gasolina na camionete, coletar os suprimentos, engaiolar as galinhas…”
“Você tem galinhas! Cara, mal posso esperar para te ver! Nós temos uma pequena cabra que encontramos aqui mas ninguém tem o luxo de ovos frescos.” Ryan interrompeu.
“Fato, eu tenho galinhas e ótimo conhecimento e habilidades que poderão ser úteis aí. Motores pequenos, sistemas elétricos, cuidar de animais, jardinagem. Espero ser útil.” Brandon respondeu.
“Parece que você é um Mick Steen, KG.” Disse Ryan.
“Mick Steen, quem é esse?” Perguntou Brandon.
“Ele é o nosso coringa por aqui. Cara mais velho como você. Arruma as coisas, liga as luzes, ordenha as vacas. Sim, vocês vão se dar bem. Ou talvez sejam como dois gatos em um saco preto.” Riu Ryan.
“Hummph” pensou Brandon para si mesmo, “esse Steen será meu assistente quando eu chegar.”
“Parece ótimo, Ryan” disse Brandon com os lábios pressionados. “Alguma novidade para compartilhar comigo? Eu sei que está ocupado e deve ir logo.”
“Claro, KG. Tenho uma ótima história. Uma mulher e uma pequena menina vieram na noite passada. A mulher pisou em alguma coisa e está com o pé bastante infectado. Não acho que ela vai conseguir. A garota, tem em torno de três anos mas está saudável. A mulher achou ela um mês atrás e elas estão a pé durante todo esse tempo. A mulher não sabia dirigir.”
“De qualquer maneira, eles não tinham um rádio e nunca ouviram nenhuma transmissão. A mulher teve um sonho para vir para essa direção e então vieram. A pequena garota continua dizendo  ‘Vá ver G., Vá ver G.’ Não sabemos porquê ou o que significa, mas isso não é incrível? A pequena garota é como um mascote nosso agora. Nós não sabemos seu nome real, mas ela é muito fofa”.
Brandon pausou e seus olhos se encheram de lágrimas, como há muito não enchiam.
“Eu mal posso esperar para conhecê-la, Ryan. Ela parece ser um milagre real.” Disse com a voz trêmula.
“Ela é sim. Ok KG, vamos planejar conversar uma última vez amanhã e então acredito que te vejo em uma semana mais ou menos, está bom?” Disse Ryan.
“Parece um plano, Ryan. Estou bastante ansioso em encontrá-lo, encontrar a garotinha e a comunidade toda o mais rápido possível.” Disse brandon.
E ele realmente queria.
——-
No dia seguinte, Brandon encheu o tanque de gasolina e ligou sua antiga Ford. Ela tossiu até que ligou, e logo, estava rodando bem. Ele checou os pneus e os fluídos e a deixou na frente da cabine.
Ele pegou dois grandes sacos e os encheu com camisas, calças e meias. Ele então pegou uma grande cesta e encheu de comida não perecível, incluindo ração para cachorro.
Satisfeito com seu trabalho, ele alimentou as galinhas uma última vez e entrou na cabine.
“Vou sentir falta deste velho lugar”, ele pensou para si, “mas ver caras novas vai ser muito melhor.”
A noite encontrou Brandon impaciente até sua ligação agendada com Ryan. Ele acabou ligando mais cedo, tendo suas tentativas ignoradas por alguns minutos. Assim como a primeira vez, o alto falante veio à vida.
“Aqui é a estação WGY906 no ar. KG, está por aí?” Disse o sotaque caipira de Ryan.
“Aqui é KG, câmbio. Como vai Ryan?” Perguntou Brandon.
“Tranquilo. Rapaz, hoje é o dia de todos os dias. Nós temos dúzias de pessoas falando conosco pelo rádio de todos os lugares e talvez muitas estejam vindo para cá enquanto falamos. Mas eu tenho boas notícias para você hoje, KG.” Disse Ryan.
“Quais?” Perguntou Brandon.
“Eu tenho uma equipe de dez pessoas trabalhando no rádio durante a noite, então quer dizer que nós podemos ter uma longa conversa. Eu acredito que sendo esta sua última noite antes de sair, provavelmente tem muitas questões.” Respondeu Ryan.
“Acho que tenho, mas vou te dizer a verdade, é muito bom ouvir outra voz humana. Acho que realmente senti saudades disso.” Disse Brandon.
“Isso é o que todos dizem, KG. Então me diga, você foi casado ou tinha filhos antes disso tudo?” Perguntou Ryan.
“Sim, eu era casado, mas isso foi a dez anos atrás. Não sei o que aconteceu… bom, na verdade eu sei. Eu nunca fui muito de conversar e mantinha as coisas para mim. Acho que isso afastou a pobre mulher. Eu percebo isso agora.” Disse Brandon.
“Não se castigue, KG. Você teve a segunda chance que a maioria não teve. Então, faz quanto tempo que você conversou com outra pessoa? Nós temos uma espécie de anotações sobre quem ficou mais tempo isolado.” Disse Ryan.
“Sério? Eu não havia pensado sobre isso. Eu fugi assim que o vírus começou a se espalhar e tive sorte o suficiente de estar fora do caminho dele quando as coisas desabaram. Eu acho que terei de ver no calendário.” Disse Brandon.
“Essa é a mesma história que a maioria de nós temos. Eu estava em Little Rock no meio de maio quando o vírus chegou em Los Angeles, Seattle e São Francisco. Depois disso, eu desci para a cidade de Baton Rouge e ajudei minha irmã e minha família até… bom, até eles falecerem. Isso foi difícil.  Então tive de permanecer escondido durante o resto do verão, enquanto o governo estava buscando pelos que ainda estavam saudáveis. Lembra disso?” Perguntou Ryan.
“Não, na verdade eu não experienciei isso, Ryan. Eu tive sorte o suficiente de chegar no meu abrigo nas colinas antes de chegar a esse ponto.” Disse Brandon.
“Você teve sorte, muita sorte. Eu não ouvi ninguém que saiu das cidades tão tarde no verão. Neste ponto as quarentenas, os bloqueios nas estradas, estava tudo travado. Você deve ser como uma raposa, Brandon.” Riu Ryan.
“Bom, eu sei ser habilidoso quando necessário. Mas isso não foi o que aconteceu. Veja, eu fugi em Abril, bem antes do vírus chegar ao meu estado. Onde eu estou agora é um local a muitos quilômetros de qualquer cidade ou casa. Quantos meses fazem? Seis? Está correto isso? O que acha disso para suas anotações, Ryan?” Perguntou Brandon com um sorriso em sua cara.
Houve um silêncio por alguns momentos antes de Ryan finalmente falar.
“Deixe-me perguntar algo para você, Brandon.” Perguntou Ryan usando o nome real de Brandon pela primeira vez.
“Desde abril, você não teve contato com ninguém? Digo, uma viagem até a cidade por alguns itens ou gasolina? Talvez uma olhada em volta nos últimos meses? Até mesmo dirigir perto de uma cidade?” Perguntou Ryan com um tom sério.
“Não, Ryan. Como eu te disse, eu estive me segurando aqui desde abril. Se você está preocupado comigo carregando o vírus, não precisa ficar assim. Eu tenho mantido um protocolo de quarentena muito rígido durante todo o tempo. Eu até tenho uma máscara e roupa contra agentes biológicos que usei durante os primeiros meses sempre que saia de casa.” Disse Brandon.
“Sim, esses respiradores, nós vimos muitos deles no final…” Disse Ryan, com a voz triste.
“Então, não imagino que você tenha algo para se preocupar Ryan. Agora você está me preocupando, como se eu tivesse feito algo errado ou você não queira que eu vá até seu local.” Disse Brandon.
“Não, você não fez nada de errado, KG. Você fez tudo certo, como nos livros. Mas a não ser que eu tenha te entendido errado ou não sei de alguma coisa, não posso deixar você vir.” Disse Ryan, de forma grave.
“O que você quer dizer,” assustou-se Brandon,”O que está errado? Eu preciso ir até aí… o que você está falando?”
“Brandon, quero que você me ouça com muita atenção. Você se auto impôs em quarentena por mais de seis meses e não há nada de errado com isso. O problema é que nenhum de nós fez isso.” Disse Ryan.
“Mas…” Interrompeu Brandon.
“Por favor, me ouça, isso é muito difícil de te falar, Brandon. O resto de nós foi exposto ao vírus, pelos amigos, familiares e estranhos antes deles morrerem. Mas por alguma razão ou outra, nós nunca ficamos doentes. Ninguém consegue explicar e mesmo aqui, nos computadores da FEMA, eles não conseguiram entender isso. Parece que as pessoas são naturalmente imunes, mas ainda são portadores.” Disse Ryan.
“Bom, obviamente eu sou imune também,” respondeu Brandon.” Digo, é um vírus que se espalha pelo ar e eu não vivo em um abrigo com ar filtrado. Então acho que não temos nada para se preocupar, temos?” Disse Brandon, com um pouco de desespero em sua voz.
“Não funciona assim, KG. O vírus se propaga pelo ar, mas em pequenas distâncias. A maioria foi infectada pelo contato e você… você não teve contato. Eu acho que há uma pequena chance, quase ínfima que você seja imune, mas o único jeito de saber é você saindo de sua cabine e vindo para cá.”
“Claro… eu farei planos para..” Disse Brandon.
“Mas as chances é de que você não é imune e vai contrair o vírus antes de chegar perto daqui. Você vai passar por alguma cidade infectada, pegar uma bomba de gasolina com a mão… de algum jeito acontecerá, você ficará doente e morrerá. Eu não posso deixar você fazer isso, a vida é muito preciosa. Eu não terei isso em minha cabeça.” Disse Ryan.
“Mas talvez haja uma cura para o vírus no centro onde você está. Talvez eles encontraram um jeito de viver aí não ficar doente. Se não, eu posso levar minhas máscaras e equipamento e viver com vocês, mas ficarei separado e coberto, ok?” Implorou Brandon.
“Não há cura, Brandon. E é assim. E seus equipamentos não vão funcionar também, Brandon. Todas as autoridades no final fizeram a mesma coisa e todos morreram. Respiradores, luvas, nada disso funciona a longo prazo. O vírus acha seu caminho para dentro.” Disse Ryan.
“Mas não é justo! Eu estou vivo, assim como você e os outros. Você não pode me fazer ficar aqui! Não é justo! Eu quero ver todas as pessoas, a pequena garota do milagre! Eu preciso mostrar para o cara Steen o quanto sei!” Gritou Brandon.
“Desculpe, Brandon, eu realmente sinto muito.” Disse Ryan de forma triste.
“Você simplesmente não me quer aí, nenhum de vocês quer. Vocês só estavam brincando comigo. Provavelmente não há ninguém aí, só você e outros trastes sem nada para fazer zoando com as pessoas dentro de um prédio velho.” Disse Brandon, com raiva.
Não ouve resposta ou som de Ryan, apenas a estática quieta do auto falante.
“Brandon, eu estarei sempre aqui se quiser conversar um pouco. Eu não sei o que acontecerá, mas mais pessoas estão vindo e tenho certeza de que teremos alguém para conversar contigo de tempos em tempos.” Disse Ryan, esperançoso.
“Claro, jogue cara ou coroa para ver quem vai ficar preso falando com o velho na floresta. O doido que não morreu. Um homem preso do mundo vivo como um lagarto no quarto de uma criança. Vendo vocês crescerem, amarem e envelhecerem… Não, obrigado Ryan.
“Aqui é KGX713 desligando. Isso significa adeus Ryan.” Disse Brandon quando ele enviou seu último sinal.
Brandon levantou e deu um soco na parede. Ele queria muito esmagar aquele rádio e jogar os restos dele no fogo, mas não podia fazer isso consigo mesmo. Então ele girou o botão para o modo scanner  indo para longe da frequência de Ryan até a próxima estação.
Brandon chutou sua mala de roupas, abriu a porta da frente e olhou para o céu escuro cheio de estrelas brilhantes como diamantes. No fundo, o auto falante se enchia com vozes quebradas de centenas de pessoas ao redor do mundo.

18 Comentários

  • De tempos em tempos venho aqui reler esse texto. Logo quando começou a pandemia do koron4 v1rus, lembrei-me da saga de Brandon.

  • Olá pessoal, a história é cheia de esperança mas, tremendamente real diante do rumo que a nossa civilização está tomando… mas creio que nós, os sobrevivencialistas, estamos no caminho certo.
    Como diria Spok; desejo a todos “vida longa e prosperidade”.
    Woodpecker

  • e pessoal quem sabe esta historia nao possa acontecer ja pensarao nisto estamos perto de uma invasao estra terrestre acredite quem quiser .

  • falcão negro

    Podemos montar uma rede nacional de radio comunicação para todos sobrevivencialistas brasileiros através do FRN (free radio network) usando o sistema PMR ( private mobile radio) asim não precisamos pagar impostos para a anatel. com repetidoras em varias cidades do brasil lincadas a um servidor na FRN todos podermos manter contato. em portugal ja existe este sistema. sou radio amador e adepto do sobrevivencialismo urbano .

    • Cheguei nessa pagina pois estava procurando justamente uma radio online que talvez já existisse, adoraria ver essa ideia pronta mas não tenho conhecimento para fazer uma kkkk. Caso já exista postem o link para divulgar. Vlw galera ótima história.

  • Pessoal, achei um item muito legal para vocês!
    Um machado indestrutivel! Isso mesmo! A garantia dele é boa… de acordo com o fabricante, se de algum jeito vc conseguir quebrar ele, a fabrica te da um novo! hahahaha
    Ele é muito leve, pois é feito de fibra de vidro.

    Olhem ai!

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    Custa em média 25 dólares, nada mal pra um machado indestrutivel!

  • Obrigado pela história mas já que eles tem tanta abundância por que o Grupo do ryan não iria visitar o de brandon já que ryan são “imunes” e também o Fema disponhe de laboratorios que poderiam coletar o sangue de brandon e fazer experiência para ver se ele é imune, já que a vida vale tanto como ryan disse todo esforço é necessário e pagavel!

    • Fala Daniel!

      O problema é que todos do grupo do Ryan já estavam expostos ao vírus mas são imunes. Então se chegassem perto de Brandon, iriam infectá-lo e matá-lo!

      Abraços.

    • Na base da Fema todos estavam mortos, ou seja, não havia ninguém, todo o pessoal capacitado que soubesse lidar com os equipamentos ou com conhecimento técnico e que conhecesse os procedimentos ou as formas para realizar os exames já não existiam mais. Foi necessário que um dos sobreviventes imunes conseguisse, com suas habilidades pessoais, fazer funcionar os geradores e até mesmo o rádio entre outras coisas. Pode ser que ao longo do tempo chegue à base algum sobrevivente capacitado para tornar isso possível, ai o pobre do Brandon talvez tenha uma chance de se reunir ao grupo.
      Boa muito educativa a estoria, o final não chega a ser trágico (descontando o quase fim do mundo) quem sabe o pessoal Ryan não encontra outros na mesma situação do Brandon e os estimula a formar um grupo à parte até que se encontre uma cura para o vírus.

      É isso ai pessoal, estejam preparados.

      • Fico feliz que tenha gostado Marcos,

        O texto é bastante interessante e nos mostra um final bastante inusitado que gera algumas reflexóes.

        Abração!

  • muito boa historia

  • Nesse ponto eu afirmo não basta “sobreviver” eu quero VIVER…
    Preso em uma casa isolada sozinho ficaria louco em pouco tempo e não encontraria motivos para continuar apenas sobrevivendo.

    • Questão de costume! Tenho amigos e a parentes de SP que quando chegam aqui no MS, ficam loucos com o silêncio, o ar puro, a tranquilidade do lugar… Claro, ter um objetivo na vida ajuda muito. Vegetar leva à loucura ou ao suicídio. No caso dos radioamadores (pessoas que praticam o radioamadorismo) montar pequenos transceptores de telegrafia (CW – código Morse) é uma boa sugestão. Os sinais dão a volta na terra. Em tempos de crise, as faixas destinadas aos radioamadores com certeza estarão cheias, quer deles mesmos ou de clandestinos e, certamente de autoridades ansiosas para saber alguma novidade. PT9HP, sempre QAP/QRV por Dourados MS.

  • Otima cronica…e pode vir a se tornar realidade…

  • Otima historia. Vlw

  • Bela história, faz a gente pensar…

  • Muito Boa a historia…Valeu pela tradução..

    Grande Abraço.

  • Valeu Julio por compartilhar!

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