Conheça o novo “sarcófago” que encobrirá Chernobyl

Sabe qual o principal problema de desastres nucleares? Eles simplesmente não somem. Depois de trinta anos, a radiação decorrente do desastre em Chernobyl continua sendo uma ameaça real e cada vez maior, visto que seu sarcófago está deteriorado e vazando material contaminado. 
O desastre de Chernobyl aconteceu dia 26 de abril de 1986, quando o reator 4 da usina de energia nuclear explodiu. Para evitar desastres de proporções gigantescas, equipes de trabalhadores doaram suas vidas para construir um grande “sarcófago” em volta do reator destruído, a fim de conter o material radioativo que estava sendo expelido.

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Destruição causada pela explosão do Reator 4 na usina Chernobyl

Quando digo que eles doaram suas vidas devo enfatizar que essa foi sem dúvida uma das ações mais heroicas que a humanidade já viu. Essas pessoas trabalharam em condições de morte garantida, apagando o incêndio, jogando concreto e construindo estruturas de metal próximo à um reator nuclear em pleno colapso. O motivo? Evitar que o reator explodisse novamente com uma força de quase 5 megatons – o que contaminaria a Europa inteira e a deixaria inabitável. 

Aqui cabe a resposta que Anatoli Zakharov, bombeiro que atuou nos primeiros momentos do desastre, deu em seu relatório:

“Nós sabíamos da radiação! Se nós tivéssemos seguido o regulamento nós não chegaríamos nem perto do reator. Mas era a nossa obrigação moral – nosso dever. Nós éramos como kamikazes.”

Anatoli morreu três semanas depois por conta da exposição a níveis altíssimos de radiação.

O sarcófago foi construído em 8 meses e é uma estrutura gigante de metal e concreto, com o nome oficial de “Obyekt Ukrytiye”, que significa abrigo ou cobertura. É estimado que dentro desse sarcófago haja mais de 200 toneladas de Corium radioativo, 30 toneladas de terra contaminada e 16 toneladas de urânio e plutônio.

O grande problema é que esta estrutura foi construída como um recurso de emergência, quando simplesmente não havia tempo para elaborar um projeto consistente. Por ter sido construído em cima das estruturas já fragilizadas da usina, o sarcófago nunca foi sólido e já era esperado que em cerca de 20 anos ele teria que ser reparado.

Contudo, aí veio o problema: Em 1996 foi considerado impossível reparar o sarcófago devido aos níveis de radiação altíssimos acima de 10.000 Röntgens por hora. Apenas como referência, o normal em uma cidade é em torno de 20-50 microröntgens por hora e uma dose considerada letal é de 500 Röntgens durante 5 horas.

Em 12 de fereveiro de 2013 uma sessão do telhado da usina ao lado do sarcófago acabou colapsando. Após análise de especialistas, estava claro que o complexo todo estava com alto risco de desabar, o que poderia expor todo o material radioativo ao ambiente mais uma vez.

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Sessão do telhado que desabou devido à deterioração da estrutura

Devido à situação inevitável, o governo Ucraniano decidiu abrir espaço para que diversos países apresentassem seus projetos de um novo sistema de contenção. Esse novo sistema deveria atingir os seguintes objetivos:

  • Transformar a região do reator 4 ambientalmente segura (conter os materiais radioativos no local para evitar contaminação de outras áreas);
  • Reduzir a corrosão e ação do tempo no sarcófago existente;
  • Diminuir as consequências de um colapso potencial do sarcófago existente, especialmente em termos de conter a poeira radioativa que seria produzida em tal colapso;
  • Permitir a desconstrução de estruturas instáveis do sarcófago com equipamentos remotamente operados;
  • Manter a contenção do material radioativo por, pelo menos, mais 100 anos.

Muitos países propuseram soluções, porém entre os 19 candidatos avaliados, o projeto britânico da empresa “Mammoet” (Mamute) foi selecionado. O projeto é bastante interessante pois, tem como proposta ser uma estrutura em formato de arco e será construída próximo a Chernobyl, para, só depois, ser deslizada para seu local final por meio de trilhos.

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As vantagens desse projeto são:

  1. Construir toda a estrutura longe da usina diminuirá as doses de radiação que os funcionários receberão;
  2. O arco entra de maneira bastante justa na estrutura do reator, permitindo uma melhor contenção;
  3. Um arco é estruturalmente mais forte do que um formato quadrado.

Essa estrutura de proporções gigantes terá uma altura de 92,5 metros e um arco com tamanho total de 245 metros – a estátua da liberdade caberia dentro de seu interior. Seu comprimento será de 150 metros e pesará mais de 2.024 toneladas quando estiver completa. Neste vídeo você pode ver todo o planejamento da construção da obra:

A obra foi iniciada em 2003 com objetivo de ser finalizada até 2005, porém seu prazo foi prorrogado várias vezes devido à complexidade do projeto e a data atual de possível finalização é 2017. Confira neste vídeo o estado atual da obra (filmado em dezembro de 2015):

Depois disso, o problema será resolvido?

Infelizmente não. Como dissemos no começo deste texto, radiação é uma coisa que simplesmente não some. Esse novo sarcófago será capaz de conter o material contaminado durante, pelo menos, mais 100 anos, mas novas ações terão de ser feitas depois disso visto que os materiais presentes no reator 4 continuarão perigosamente contaminados por estimados 20 mil anos.

Um simples erro humano causou um desastre que perdurará por um tempo incalculável. Centenas (possivelmente milhares) de vidas foram afetadas por esse acontecimento, e com certeza em um futuro não muito distante teremos de lidar novamente com a misteriosa e mortal Chernobyl.

Para conhecer mais sobre essa história e ver o estado atual da cidade de Prypiat – que fica em volta de Chernobyl e hoje está completamente abandonada – recomendamos este documentário:

No mais, estejam preparados.

Até.

16 Comentários

  • Fico imaginando como será que está sendo construída Angra 3 depois de tantas denúncias da lava jato!!! Será que estão seguindo os protocolos? Só espero que não fique igual a passarela…

  • RockShooter

    Olá senhores, sou leitor assíduo do Sobrevivencialismo.com e o que me mantém fiél ao Blog é a inesgotável busca pelo conhecimento e pela verdade que o Júlio Lobo sempre demonstra em seus artigos, mas infelizmente nesse artigo sobre Chernobyl, a fonte do Júlio foi falha, pois existem muitos furos, mitos e inverdades tanto sobre o acidente de Chernobyl quanto à natureza dos materiais radioativos. Eu trabalho na área nuclear e foi estudando e fazendo experimentos que aprendi que os materiais radioativos realmente são perigosos, mas não tanto quanto a mídia propaga por aí, o que eles fazem é desinformar e amedrontar as pessoas.

    Júlio, minha crítica não será para você, pois entendo que você teve a melhor das intensões no sentido de informar os leitores do Sobrevivencialismo, minha intensão é apenas colaborar para não criar situações semelhantes ao do seu artigo “5 pontos que podem prejudicar um sobrevivencialista – Comportamento Ep.3”, que a propósito gostei muito.

    Não dá pra explicar tudo com detalhes, pois o assunto é muito extenso, mas tentarei fazer alguns breves apontamentos do que está escrito no artigo e explicarei como aquilo funciona de forma sucinta. Só vou apontar o que me pareceu aberração, outras coisas menores vou relevar. Sinto muito quanto a algumas referencias em inglês, mas tem pouco material em português. Estas referencias que citei não são regulares (as regulares são mais complicadas de entender) e podem conter alguns erros técnicos, mas são suficientes para leigos da ciência nuclear:

    1- ”Evitar que o reator explodisse novamente com uma força de quase 5 megatons – sinto decepcioná-los, mas tratava-se de um reator nuclear e não uma bomba nuclear. É impossível um reator nuclear explodir a partir de uma explosão nuclear, em Chernobyl houve uma explosão devido a uma sobrepressão de vapor, que foi superaquecido devido a uma “pronto-criticalidade” (prompt criticality – leia o link abaixo pra entender) que foi causada por uma “excursão de potencia supercrítica” onde o reator dobrava de potencia a cada um segundo, a água ficou tão quente que era impossível permanecer em estado liquido e vaporizou, essa vaporização aumentou drasticamente a pressão muito além dos limites de projetos. Tudo isso foi causado por um membro do partido soviético que liderava o teste que estava sendo feito, esse cara nem mesmo era formado naquele tipo de reator nuclear, ele nem sabia como o equipamento funcionava e suas características técnicas. O reator de Chernobyl foi projetado para operar pressões na faixa de 73 kg/cm2 (que é a pressão de operação de grandes caldeiras) porém a pressão ultrapassou muitíssimo a pressão de projeto e resultou em uma explosão.

    Pronto criticalidade:
    https://en.wikipedia.org/wiki/Prompt_criticality

    O que garante o funcionamento de um reator nuclear (e de uma bomba) é a sua “massa crítica”, sem massa crítica não há fissão. A massa crítica de Chernobyl foi garantida com uma concentração de 2% de urânio-235 e 97,6% de U-238 que é uranio natural, fracamente radioativo (Angra-1 e 2 são enriquecidos a cerca de 4%). O U-235 que irá fissionar e gerar a energia térmica desejada no projeto, o U-238 transmuta para plutônio e depois fissiona. Para que uma bomba nuclear exploda, ela tem que ser enriquecida a pelo menos 99% de U-235 (ou outro elemento físsil). Uma bomba nuclear fraquinha tem uns 10 kilotons (a bomba de Hiroshima tinha 13 Kt), uma bomba de 5 megatons é muito potente, pra chegar nisso é necessário muita energia e engenharia nuclear. Então quando um reator irá explodir com 5 megatons??… NUNCA!!!… independente do prédio do reator ser ou não lacrado, o material físsil iria ficar fissionando até acabar todo combustível (isso lançaria no ar muito material radioativo), isso aconteceu durante alguns anos, do mesmo modo que ocorre em um reator, porém em um reator o operador controla tudo. Em um reator cujo núcleo fundiu (derreteu) o material vai fissionar de forma descontrolada… e a explosão continua sendo impossível!!

    Massa crítica é a quantidade de massa necessária para manter uma reação nuclear em cadeia autossustentada. A massa crítica de um material fissionável depende das suas propriedades nucleares, das suas propriedades físicas (a densidade, em particular), a sua forma, e a sua pureza.

    2- “Manter a contenção do material radioativo por, pelo menos, mais 100 anos” – uma curiosidade é que este é o tempo que as autoridades nucleares russas e ucranianas concluíram que a região estará apta para receber moradores e para o plantio, portanto é muito lógico projetar uma cúpula de proteção que dure pelo menos 100 anos… não procede o medo que em 20.000 anos a área estará perigosamente contaminada, quem tiver dúvidas quanto a isso, vide Hiroshima e todos os campos de testes de artefatos nucleares ao longo do globo, a maioria deles são pontos turísticos seguros. No caso de Chernobyl demorará mais tempo devido ao tipo de acidente não ter consumido todo o combustível de forma instantânea como nas bombas.

    Porque a região ficará segura??… pelo fato de existir algo chamado “decaimento radioativo” onde a atividade radioativa do material cai pela metade após determinado tempo (meia-vida). O decaimento radiológico é logarítmico (decai muito rápido) e cada material tem a sua meia-vida, alguns materiais tem alguns minutos, outros alguns meses e alguns chegam a anos. A consequência disso é que após cerca de 11 decaimentos (11 meias-vidas) não haverá uma quantidade significativa de radioatividade e a resultante final é um material com radioatividade baixa. Ou seja, o acidente de Chernobyl foi um erro humano que causou um desastre que perdurará por um tempo “calculável”.

    Decaimento radiológico (radioactive decay):
    https://en.wikipedia.org/wiki/Radioactive_decay

  • paulo andrade

    Julio, bom dia. Esse seu artigo arrasou, pela qualidade impecável. Recomendei até pros meus inimigos!!!!

  • Murilo Almeida

    PUTZ… Duas coisas me chamam a atenção: 1ª) que a radiação é uma coisa que simplesmente não some; 2ª que a contaminação permanece por estimados 20 mil anos… RESUMINDO, o homem se mete a DEUS porem nada sabe e nada pode fazer contra um acidente como estes de CHERNOBYL ou mesmo FUKUSIMHA…

    Se quisermos ir mais além, vamos falar do Conseil Européen pour la Recherche Nucléaire (CERN) atualmente chamado de Organisation Européenne pour la Recherche Nucléaire (OERN) , na França, com seu acelerador de partículas que ora tenta recriar o “bigban” ora tenta recriar antimateria ou buraco negro…

    • RockShooter

      Murilo, a radiação some sim, o que define um material radioativo é o fato dele emitir partículas ionizantes ou ondas gama, isso é chamado de “decaimento radioativo” que como resultado final será um “estado fundamental” não radioativo. Como exemplo lembre-se do iodo radioativo usado na medicina, depois de 3 ou 5 dias a pessoa não está mais com material radioativo, mas uma parte do iodo ainda está nela, porém este iodo não é mais radioativo.

      É mito esse lance de radiação durar 20 mil anos, primeiro você tem que saber de qual elemento radioativo está se referindo. No caso de um núcleo de um reator que se fundiu, especialistas (de verdade) calculam que em cerca de 100 anos não haja mais perigo de radiação, se você quiser pode até dobrar esse tempo, ainda sim fica muito longe de 20 mil anos de perigo.

  • Júlio na sua opinião, Se o Brasil fosse invadido por um outro país e que, o que aconteceria se Angra 1, 2, e 3 fossem bombardeadas por mísseis, você acha q a população que mora perto dessas áreas correria risco de contaminação por radiação?

  • Sobre este tipo de assunto não tenho muito conhecimento.

    E Sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki? Após tantos anos ainda existe algum tipo de risco de contaminação por radiação nessas cidades?

    • RockShooter

      Não existe nenhum risco de contaminação nesses lugares (pessoas moram lá e inclusive existem plantações) pois o artefato consumiu todo o uranio/plutonio instantaneamente, a radioatividade se deu devido aos produtos resultantes da fissão…. diferentemente, em Chernobyl o uranio ficou vários anos fissionando até acabar a massa crítica, atualmente a radioatividade é muito baixa, porém ainda existe… Em Fukushima o acidente ainda está acontecendo, ainda existe fissão.

  • CARO JÚLIO

    BOM DIA, AQUI DE PORTUGAL.
    TENHO UMA PERGUNTA:

    O QUE É FEITO DE FUKUSHIMA ???????????

    NEM UMA PALAVRA NA IMPRENSA INTERNACIONAL. DÁ O QUE PENSAR.
    ABRAÇOS

    RAMIRO LOPES ANDRADE

  • O ss18 , o míssil inter continental da Rússia, é equivalente a 100 vezes o acidente de Chernobyl.
    Pela internet, lê-se que a Rússia, teria 2700 misseis apenas do SS18.
    Os EUA, também não deixariam essa barato e também tem seus brinquedos nucleares.
    Então pense, vivemos em um mundo que poderia ser facilmente aniquilado, com a menor das ameaças de uma guerra atômica.
    Tipo onde fica nós, o pequeno sobrevivencialista do interior?
    Sabe é algo desesperador de se pensar.

    • Desesperador NA REAL! Infelizmente não tem “preparação” suficientemente eficiente para isso… :/ Aqui no RJ eu tenho pesadelos prévios com os III monstrengos que estão em Angra dos Reis. E com o “sucateamento” de tudo.. já viu…

    • As chances das armas nuclear serem usadas por uma simples guerra é irreal, são armas de dissuasão, são armas que só de o inimigo ter uma em seu arsenal já deixa o risco de uma guerra bem longe de acontecer, o melhor exemplo disso é a Índia e o Paquistão, que depois dos dois terem ogivas nuclear simplesmente acabaram as guerras entre os dois países. Quanto as usinas de Angra, elas seguem todas as normas de segurança da IAEA e mesmo que reatores antigos conseguem supri todos os requisitos de segurança operacional.

  • carlossilvapb

    E existem vários reatores nucleares espalhados pelo mundo, que, quando ficarem obsoletos, também serão fonte de eterna preocupação. Isso sem falar no grande número de reatores nucleares móveis que servem de fonte de força para submarinos e navios nucleares. Muitos desses veículos, já descomissionados, foram simplesmente abandonados, especialmente os da antiga URSS, sabe-se lá em que condições de armazenamento…

    • RockShooter

      Os reatores nucleares, independente de serem antigos ou novos, não representam problema nenhum enquanto seus núcleos estão intactos (sem acidentes). Os núcleos usados ficam 10 anos dentro de piscinas sendo resfriados (ainda geram muito calor) e depois mais 10 anos fora dessas piscinas (não geram mais calor), após esses 20 anos ou são enterrados de forma permanente ou são enviados para serem “reciclados” em alguma fábrica altamente especializada (no Canadá e na Rússia esse tipo de fábrica). O urânio volta para os reatores e os outros elementos que surgiram da fissão são aproveitados para outros fins.

      Até o início dos anos 90 os sovieticos (e depois os russos) simplesmente afundavam os seus submarinos nucleares que por ventura sofressem algum tipo de acidente nuclear, no mar de Kara tem cinco deles (além de além de 16 reatores e 17 mil conteineres de rejeito radioativo).

      Atualmente a Rússia recebeu dos EUA métodos de desmontar seus submarinos antigos (201 submarinos) e reciclar o combustível, vão desmontar inclusive dois (de três) classe Akula. Já desmontaram mais de 100 desses submarinos de forma segura.

  • Que o desastre e suas consequências sejam lembrados quantas vezes forem necessárias para que sirva de exemplo.

  • Já havia assistido o documentário. É muito bom, e fala sobre a potencialidade dessas explosões nucleares.
    Outra coisa, embora as pessoas vão dizer que e culpa dps comunistas, da CCCP. Fica claro, que NÃO se pode confiar em qualquer tipo de governo.

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